segunda-feira, 11 de julho de 2016

In Memoriam: Abbas Kiarostami

 
No À pala de Walsh, despedimo-nos sempre, com admiração e carinho, daqueles de quem mais gostamos. Para ler o nosso In Memoriam Kiarostami aqui (clicar).
 
 
O meu contributo:
 
"Antes de ser um apreciador do cinema de Kiarostami, já tinha dois apreciadores em casa. Os meus pais tinham um cassete VHS inglesa de Ta’m e guilass (O Sabor da Cereja, 1997) (penso que a minha mãe a trouxe de Londres quando lá estagiou, teria eu uns 8 ou 9 anos), cuja capa e sinopse me foram intrigando à medida que fui crescendo, no início um elemento puramente excêntrico para uma criança (um filme do… Irão?! Onde fica o Irão, mãe? Como são as pessoas lá?), depois um farol cinéfilo e indicador de que havia todo um “outro mundo” à minha espera, o mesmo no qual mergulhei definitivamente quando encontrei o Cineclube da Faculdade de Direito (para cuja programação uma colega minha escolheu mesmo o filme em 2012) e onde, aliás, me lembro de ouvir alguém (penso que foi o Pedro Ramires, cinéfilo da Faculdade de Economia e nosso fiel espectador) a citar pela primeira vez a famosa – e mal-entendida – frase do Godard de que o cinema tinha “morrido” com o Nema-ye Nazdik (Close-Up, 1990).
 
A segunda recordação mais nítida que tenho do Kiarostami é, novamente, familiar: no Verão de 2010, enquanto estudava para os exames, ouvia o meu pai no quarto, na sala ou à janela a entoar dramaticamente: “SHIRIN… SHIRIN… OH SHIRIN…!”. Lembro-me de a minha mãe chegar a casa e já estar pelos cabelos quando o meu pai a saudava dessa forma. Como acontece muitas vezes, a paixão do meu pai com o Shirin (2008) levou-nos a todos ao antigo Cinema Nun’Álvares (o meu pai viu o filme cinco vezes só durante o tempo em que esteve em exibição nas salas), momento em que também eu me apaixonei (não com o grau de obsessão do meu pai, ainda assim). Não sendo um conhecedor profundo da sua filmografia, a minha relação com Kiarostami é, por isso, e antes de mais, familiar, afectiva e afectuosa, bem condizente, de resto, com a extrema sensibilidade e delicadeza dos seus filmes e das suas personagens. Entre os cinéfilos, há aquele velho lamento/desejo de voltar atrás no tempo para poder ver determinado filme novamente pela primeira vez (para se apaixonar pela primeira vez, tal e qual como no amor por uma mulher); por isso, numa hora triste como esta, um pequeno oásis de alegria lembra-me que ainda há muitos filmes dele que tenho para descobrir".

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